Estar na Pele da Laura: Página 01

Mudar de país é ser folha em branco

Mudar de país é como nascer de novo, alguns dizem.

Eu não acho que seja bem isso. Mas também não sei exatamente o que acho. 

De fato, antes de vir você precisa de novos documentos, passaporte, visto. Quando você chega muitos documentos mais. Documento de identificação local, tirar outra habilitação de trânsito, abrir outra conta no banco, fazer outro cartão do plano e do sistema de saúde, dentre uma infinidade de papéis e burocracias para obtê-los e poder só seguir a rotina.  

Você aprende a pronunciar seu nome de outra forma, para conseguir que te compreendam. 

Você aprende a pronunciar tudo de outra forma. Você aprende um mundo novo de palavras diariamente, mesmo já sabendo a língua do país. Você precisa do tradutor no mercado, no restaurante, no dentista então nem se fale, haja palavras novas. Celular sem bateria nem pensar. 

Você se sente uma criança.

Precisa perguntar para outras pessoas como fazer as coisas mais banais. “A água do bebedouro acabou, como repõe?”, “Preciso ir ao dentista o que fazer?”, “Cortei a mão, como chega no hospital? E o que fazer ao chegar lá?”, “Como limpa esse fogão?”, “Como fechar essa porta sem chave?”, “Devo cumprimentar os vizinhos quando os vir do meu quintal?”.

Você não se sente mais parte do seu país, está rolando feijoada, carnaval, aniversário do filho da vizinha e você não está em nada. Mas também ainda não frequenta a casa de ninguém no novo país. Ainda não tem um restaurante ou café preferido.  

Tem muitas coisas boas. Um infinito de novidades, que te permite crescer, ampliar seus horizontes, seu repertório e vocabulário de vida. Mas em muitos momentos é bem solitário. 

O lado bom dessa jornada solitária é não ter tantos ruídos e se permitir ouvir a si mesmo. Ao que você de fato gosta. O que você de fato quer fazer. Sem tantas pessoas para atender às expectativas, sem tantas amarras ao que a sociedade espera de nós. A sociedade que nos recebe como imigrantes, acaba não esperando muita coisa de nós, talvez alguns estereótipos como sambar e jogar futebol, mas se espantam só pelo fato de que conseguimos nos comunicar. 

Então se você está passando por uma adaptação como essa, se permita se sentir como uma criança. Se permita ver a beleza de ter e ser uma folha em branco. Para recomeçar. Agora já com toda a bagagem de vida que já tem. Fazendo novas escolhas, construindo novos hábitos e amizades. Construindo a vida que você deseja e que conversa com a sua essência. Se fazendo lar, mesmo em outra casa, em outro país.  


***

Laura Amâncio Rezende

Encontrou na psicologia positiva uma ferramenta para construir um mundo mais saudável e mais feliz. Enquanto mentora indivíduos na busca das suas definições de sucesso e felicidade, vive na pele de uma esposa, empreendedora, vivendo no exterior.



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