Sexo Dito

Possessed Photography/ Unsplash

Há experiências que o corpo comunica e que são difíceis de verbalizar. Às vezes, uma vida inteira ainda é pouco para que se articulem e nomeiem os sentidos das sensações sexuais e do reconhecimento de como se dá a construção da nossa percepção da sexualidade e do papel do sexo em nossas vidas. 

Eu sei que isso tudo parece muito distante das temáticas que norteiam minha prática profissional e parece loucura querer relacionar sexo e competência comunicativa, mas, de certo modo, estou puxando uma meada de raciocínio de imensa importância que é a identidade para a comunicação.

Um bom começo é entender que a complexidade do assunto se justifica porque contrapõe nossa inépcia na compreensão das sensações pessoais corporificadas ao nosso pouco conhecimento sensorial do corpo; entre eles há um acervo inominável de significados socioculturais sobre sexo em sua ampla terminologia. 

Aliás, esse acervo atravessa os séculos reeditando a narrativa que nos molda e que por sua vez é moldada pelas crenças sociais, se encarregando de imprimir muita tensão às interações pessoais, especialmente ligadas à libido e ao sexo, mas, não somente.

Por outro lado, a linguagem passa pela elaboração psíquica das experiências e do conhecimento, no entanto, ela também traz consigo as ideologias e crenças. 

Neste sentido, o que se diz é que biologicamente a vida humana tem início no ato carnal heterossexual e, dito isto como “normal”, todo desdito é visto como anormal e encontra dificuldades para manifestar-se.

A sexualidade em múltiplas possibilidades combinatórias (LGBTQIA+) fica submersa nos arquivos de temas intocáveis, provocando  enormes crises identitárias, com efeito sobre a comunicação, evidentemente.

A verdade é que precisamos colocar em palavras as sensações e as experiências. Precisamos corporificá-las e não prototipá-las, para transpor os limites da própria linguagem. Verbalizar e articular as palavras que sentimos é um meio potente de ampliar os modelos socioculturais e desmistificar as crenças compactadas, reduzidas e, muitas vezes, perversas, com doses de discurso moral, religioso, associado a asco, sofrimento ou libertinagem.

Portanto, falar sobre sexo é uma forma de quebrar velhos paradigmas e, por isso, é um meio estratégico de se entender o poder da boa comunicação para saúde do corpo, da mente e das relações, visto que o reconhecimento da identidade passa pela trilha de criação de significados, com caráter exploratório  – questionável, observável, desfrutável e experenciável.

Didaticamente, pensar, sentir, perceber, agir são antecedentes ao ato de comungar, refletir, analisar, compreender e transformar - ações características da comunicação saudável que promovem respeito, pertencimento e conexão. 

Poeticamente seria como dizer que é preciso olhar para si antes de expressar-se ao mundo. Mas, não um olhar qualquer, é preciso profundidade para considerar o corpo e reconhecer a energia sexual sem menosprezar os desejos e os verbos que nos identificam.

As nossas experiências sociais concretas e corporificadas determinam nossas elaborações reais, incluindo as escolhas discursivas, o modo como nos apresentamos, como contamos sobre nós, como compartilhamos nossas vivências, como nos constituímos sujeitos da vida. 

Refletindo que se falar sobre nós representa uma tarefa difícil ou constrangedora ou confusa, há indícios de que precisamos reaprender a nos ver e a reparar os argumentos físicos e emocionais que nos desconectaram de nós. Desaprender e reaprender a colocar percepções em palavras claras, e assim, ressignificar nossa identidade por meio da tríade do autoconhecimento, autoconfiança e congruência, incluindo o corpo, o pensamento, a sexualidade e a expressão psíquica.

Eu, mais uma vez, entendo que a complexidade do assunto e a impermanência das situações são complicadores que abalam a lógica que deveria sustentar essa discussão, mas, reafirmo que precisamos falar mais sobre nós, e sobre sexo, sobre sexualidade, sobre diversidade, para que a comunicação, como essência das conversas boas, seja nosso recurso mais poderoso para vencer preconceitos e construir relações bem cuidadas, com mais compreensão, inteireza e amorosidade.

Para tonificar a ideia da integração de quem somos e quem expressamos ser, vale a criação de um bordão que nos sirva como lembrete: COMUNICAR-SE É INCLUIR-SE. 



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Daniela Cais

Mestre em Fonoaudiologia – Comunicação Profissional (PUC-SP), Consultora de Comunicação Corporativa, Palestrante, Mentora e Escritora.

Instituto Bem do Estar

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