Mulheres em movimento

Hulki Okan Tabak /Unsplash

Dedicar um determinado mês a temas importantes contribui para chamar a atenção das pessoas para questões sobre as quais o aprendizado, ou mínima familiaridade a respeito, são essenciais para o processo civilizatório. Processo civilizatório é aquele que estimula a cidadania por meio da cultura e do acesso à informação relevante e confiável, que diz respeito à preservação e promoção de uma vida saudável a todos, sem exceção, individual e coletivamente. 

O mês de março é considerado o mês da mulher, em que nos propomos a dar especial atenção a como é ser mulher na atualidade. 

Inicialmente quero esclarecer que minhas ideias têm origem em vivências, minhas e de outras mulheres, sendo fruto da convivência, das trocas, da observação, da presença, do contato com histórias de vida e de morte, ainda que nem sempre nossos olhares tenham se cruzado uma vez sequer. Observadora que sou, não raro me percebo testemunhando a existência e a forma de cada uma estar no mundo. 

Nosso cotidiano materializa forças construtivas e destrutivas, avanços e retrocessos, luz e sombra. Boa aparência em uma face e bastidores mantidos a sete chaves em outra. Vivemos em meio a intensos contrastes. Crianças superprotegidas e cuidadas estão na mesma calçada em que perambulam crianças que há muito não sabem o que é se divertir. O sim e o não como experiências prevalentes, sem ponderação. 

Cada época tem suas causas pelas quais devemos lutar, que nos motivam a sair no mundo.  Parte da beleza de ser humano é o envolvimento, para o mundo ser melhor para todos. 

Mulheres no ônibus, bolsas e sacolas, celular ligado: resolvem os problemas do vizinho, do filho, do vizinho do vizinho, dos pais que moram em outro estado, da colega que perdeu o emprego: “pode deixar que eu vou ver com a amiga da minha amiga, vamos conseguir, fica tranquila que vai ficar tudo bem”. 

Mulheres especialistas em cortar caminho, fazerem três, talvez quatro coisas ao mesmo tempo, incluindo imprudências no trânsito e chegarem à porta das escolas, sorriso no rosto e ouvidos disponíveis.  

Mulheres que administram inúmeras frentes simultaneamente. Exemplos de gestão eficaz. 

Mulheres cuja atitude reflete a prevenção ao desperdício, seja de comida, de água, de energia. Aprendem e ensinam ao longo de gerações, a reaproveitar, a fazer mais com menos, visando a sustentabilidade, conceito oposto da exploração. 

Ser mulher implica em deixar para trás a ingenuidade e abrir caminhos. Questionar os valores que vem determinando o uso da energia de vida, em grande parte os articulados ao mundo do trabalho e às “bancas de avaliação”.  

Desacelerar já não basta.  Ser resiliente não resolve no longo prazo, porque não gera mudança. 

Começar por nós mesmas é condição necessária, ainda que insuficiente. Cultivar uma conduta que possa, de alguma maneira, em algum momento, encorajar mulheres e meninas a não duvidarem de si, mantendo-se abertas à transformação, apesar do medo ou justamente pelas provocações que nos traz. Talvez a jornada heroica feminina tenha muito a ver com adquirir confiança sobre o valor de sua efetiva participação no mundo. Tem a ver com aceitar incertezas, enfrentar desaprovações aprendendo a negociar, afinal, a unilateralidade é um campo estéril. 

Ser mulher, ser homem, ser gente, transgênero, transmutado, transportado, transformado, transcendente. 

A ousadia em quebrar padrões sendo acompanhada de ações que façam dos conflitos inerentes à transformação, uma oportunidade de avanço e ir além da mera disputa por espaços de poder e tudo permanecer como está, mudando apenas de figurino. 

Diferenças na remuneração, no exercício de cargos de liderança,  no investimento em desenvolvimento profissional. Violências explícitas e implícitas. Para fazer valer o salário tem que saber jogar em todas as posições e ainda ter fôlego para tapar buracos, compensar faltas e ineficiências circunstanciais. Tornar-se indispensável. 

Depressão acomete mais meninas e mulheres. O número de mulheres desempregadas é maior que o de homens. O percentual de mulheres dispensadas após se tornarem seres invisíveis aos cinquenta e poucos anos é desconcertante. 

A mensagem que gostaria de deixar é a seguinte: preservem os joelhos porque a caminhada é longa. Ao redor e ao centro da terra, de si mesmo. Perseverança pelo Bem do Estar para uma vida longa, formada por ciclos, muitos, muitos ciclos. Inesperados, bem-vindos, assustadores, surpreendentes. 
— .

Ser mulher é empreendedorismo. É tentar criar espaços intermediários, onde encontrar mais pontos em comum do que divergências. É reciclar. É movimento. 

***

Marcia Moura

Psicóloga, curiosa por diferentes saberes e perspectivas, tem dificuldade de responder sucintamente à pergunta “o que você faz?”. Interessada por pessoas, que são um mundo que se revela a cada encontro e transformam a quem se deixa afetar. Gosta de pensar junto, criar e realizar junto, de ser par, ser parte. Há muito se dedica a cultivar sementes, sempre com a convicção de que irão, cada uma a seu tempo e no tempo possível, viver e expressar sua singularidade.

Marcia Moura

Psicóloga 

Curiosa por diferentes saberes e perspectivas, tem dificuldade de responder sucintamente à pergunta “o que você faz?”. Interessada por pessoas, que são um mundo que se revela a cada encontro e transformam a quem se deixa afetar. Gosta de pensar junto, criar e realizar junto, de ser par, ser parte. Há muito se dedica a cultivar sementes, sempre com a convicção de que irão, cada uma a seu tempo e no tempo possível, viver e expressar sua singularidade. 

No momento, está envolvida com as seguintes iniciativas:  

Desenvolvimento profissional: situações de decisão, mudanças, transição.

Despertar e Desenvolver interesses: identificação de caminhos profissionais.

Mentoria em cultura & gestão de pessoas, desenvolvimento de lideranças. 

Atuou nas áreas de RH (Banco Credit Suisse) e de Desenvolvimento Institucional (Insper).  

Anterior
Anterior

“São fáceis porque são pobres”

Próximo
Próximo

Consciência – abraçando nossa inteireza dentro dos ciclos femininos