Os ciclos da gestação e do Ser Mãe

Juan Encalada/ Unsplash

Querido SENHOR TEMPO, venho através desta carta relatar o quanto tem me faltado, já não sei se realmente existe porque nunca o tenho, nem imagina o quanto gostaria que passasse devagarzinho, pois tenho a impressão que não o aproveitei no crescimento de minha filha, sinto tanto vê-la espichar rapidamente. A chegada dela foi como um sopro e neste exato momento me encontro nos preparativos para o seu primeiro aninho, MUITOS CICLOS SE PASSARAM nesse meio “Tempo”.

E antes que eu me esqueça tudo que foi ruim e em minha memória só habite as mais belas lembranças vou logo contar que desde o primeiro momento do gestar foi desafiador, a real gravidez não é tão linda como se ouve falar ou como se imagina, carregar a vida mais importante da minha vida não foi tarefa fácil, doei tudo o que tinha e tudo o que sou para abrigar o amor em mim, compartilhei o meu mundo e isso requer entrega total de quem você é, do seu corpo, do que gosta de comer e vestir. Penso que neste momento deixamos de ser um pouco de quem somos e começamos a nos tornar a mulher que seremos quando o bebê nascer, como numa preparação, ou melhor, um intensivão de transformações, amadurecimento e muito amor. Sei que estou citando aqui muitas coisas lindas, mas não pense que não falarei de toda parte ruim, como aquelas pequenas cólicas que te fazem ter muito medo de um aborto, ou aqueles enjoos que nos impedem de se alimentar como gostaríamos, e a azia, essa fez questão de comparecer todos os dias da minha gravidez, e muitos outros detalhes que cada mulher apresenta do seu jeitinho e que eu chamo de PRIMEIRO CICLO, o primeiro passo de uma vida inteira compartilhada com o seu mais novo ser. 

E então começa o SEGUNDO CICLO que se encontra no meio da gravidez, posso dizer que para mim foi o melhor momento do gestar, quando minha barriga já estava grandinha e todos podiam ver que eu não andava mais sozinha, mas também não tão grande a ponto de me fazer cansar. Nesse momento eu já sabia que seria uma menininha e aquela sensação gostosa de preparar o quartinho, arrumando a bolsa e o coração enquanto sentia aqueles chutinhos na barriga para me dar a certeza de que tudo estava bem e logo iria conhecer o meu grande amor. Esse ciclo se encerra com a chegada do TERCEIRO, que é totalmente o oposto do anterior, esse momento é tomado por dúvidas, medos e ansiedades. O peso da barriga foi se tornando difícil de relevar, a vontade de fazer xixi a cada segundo causa um grande problema, noites e noites sem conseguir encontrar uma posição confortável para dormir e na mente habitando tantos porquês sem respostas, nesse momento tinha a vontade de arrancar sozinha o meu bebê, já não suportava mais a espera, foi o momento mais difícil de todo o gestar.

Nesse finalzinho precisei encontrar forças para aguardar o momento que ela decidisse nascer e mais uma vez me vi abrindo mão das minhas vontades em prol do melhor para ela e repetia incansavelmente o mantra “aguenta só mais um pouco e logo verá o seu tão sonhado pacotinho”. 
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E quando menos se espera, no dia que você tinha tantas coisas para fazer o seu bebê resolve que é o momento ideal para chegar, e então começa o QUARTO CICLO, o mais aguardado dos últimos meses e se eu fechar os olhos agora mesmo ainda me lembro daquele cheirinho quando ela nasceu, os médicos dizem que é cheiro de parto, mas para mim é o cheiro que me faz recordar o melhor momento da minha vida, nada supera aquele alívio que senti quando tive a certeza de que tudo estava bem, que você chegou linda e saudável. Nesse instante cheguei a acreditar que tudo seria assim, paz e amor como num sonho só não esperava a quantidade de medo que senti e que continuaria sentindo cada dia da minha vida. Achei que depois desse momento tudo iria ser como imaginei, mas foi bem diferente quando me vi sozinha com ela nos braços chorando sem parar me senti tão perdida, sem saber o que fazer e me desesperei, fui tomada pelo medo e mal sabia eu que o pior ainda estava por vir, descobri depois de dois dias o quanto poderia ser doloroso amamentar, seria capaz de colocar esta parte em um ciclo próprio para expressar com precisão o quanto sofri nessa fase, mas acredito que todo esse primeiro momento com o bebê faça parte do mesmo ciclo.

Depois de quase doze meses de adaptação me encontro no QUINTO CICLO relembrando cada detalhe de todos os que passaram sentindo uma saudade incontrolável e sem entender o porquê de ter passado tão rápido, sinto que me perdi no meio de tantas trocas de fraldas, roupinhas minúsculas para lavar e passar diariamente ou no meio das centenas de mamadas e arrotos me deixei esquecer de aproveitar e passei a vivenciar apenas cansaço, uma exaustão enorme que me fazia querer está em outro lugar e por isso acabei deixando de curtir cada minuto, acho que também estou arrependida por não ter me sentido mais feliz, porque te perdi tanto Senhor Tempo? Foquei no lado negativo e nos pesares quando a coisinha mais importante da minha existência estava crescendo, dando a primeira gargalhada, o primeiro passo, fazendo a primeira birra, falando a sua primeira palavrinha ou experimentando os primeiros sabores e texturas e todas essas evoluções incríveis que acontecem todos os dias. 

Expondo todos esses eventos de cada fase meu coração se enche com uma vontade enorme de aproveitar cada momento desse PRÓXIMO CICLO como se fosse o último, sem se importar com os brinquedos espalhados pela casa e com toda a comida no chão na hora do almoço, as roupas sempre manchadas e os pezinhos sujos. Agora posso ver tanta beleza em tudo que me deixava bastante irritada e não quero mais perder nem um minuto sequer do seu crescer minha filha, parabéns pelo seu primeiro aniversário. Prometo estar presente de corpo e alma em cada novo ciclo


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Louise Barbosa 

Gestora de recursos humanos pelo Centro Universitário Jorge Amado e Psicanalista formada pelo Instituto Oráculo de Psicanálise, aborda temas como ansiedade, depressão, autoconhecimento e maternidade. Atua em consultório particular na forma presencial e online. Também é uma utilizadora da clínica peripatética em casos específicos. 



Louise Barbosa

Gestora de recursos humanos pelo Centro Universitário Jorge Amado e Psicanalista formada pelo Instituto Oráculo de Psicanálise, aborda temas como ansiedade, depressão, autoconhecimento e maternidade. Atua em consultório particular na forma presencial e online. Também é uma utilizadora da clínica peripatética em casos específicos. 

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