Você sabe a diferença entre ouvir e escutar? – Não responda!
Para saber a diferença entre ouvir e escutar imagine-se em uma conversa em que seu pensamento se distrai e de repente você está divagando sobre outras coisas. Nesse momento, é possível que você ainda ouça a pessoa que fala, no entanto, já não escuta o que ela diz. Há uma quebra de conexão, entende? Dito assim fica mais fácil perceber o quão prejudicial é a falta de escuta para os relacionamentos de qualquer natureza.
Mas, não é só isso. Não existe comunicação sem escuta. Tecnicamente, ouvir é captar o som de forma passiva e decodificá-lo, enquanto escutar envolve a presença intencional e o esforço para compreensão do que é dito e do contexto que se diz, inclusive entre surdos com o uso de libras, pois escutar transcende os sons. Portanto, a falta de escuta anula o sentido da comunicação. Palavras, apenas.
Exatamente por essa exigência de envolvimento, evidencia-se a complexidade do processo voluntário e intencional, que muitas vezes nos leva a criar (internamente) respostas emocionais que interrompem o fluxo e prejudicam os relacionamentos. O psiquismo atravessa a escuta e, mais uma vez, precisamos nos esforçar para permanecer em sintonia.
É bom frisar que tanto o nível de audição quanto o de escuta são preponderantes para a sustentabilidade da saúde mental. Ouvir bem faz parte de nossas defesas fisiológicas: a audição funciona como um guia e é uma das maneiras de apresentação do mundo que experimentamos com mais segurança. Por sua vez, escutar nos proporciona experiências de conexão, pertencimento e descobertas sobre nossa identidade, nossa comunidade, nossa diversidade.
O inverso é também verdadeiro: a baixa acuidade auditiva pode fazer emergir sentimentos contraditórios e até limitar o desenvolvimento emocional, assim como a ausência de escuta pode levar ao isolamento social, frustrações e depressão. Portanto, não se trata de sobrepor uma habilidade ou outra, ambas são parte de nossa estrutura existencial e não devem ser negligenciadas. Entretanto, ouvir é, em certa medida, involuntário e passivo, o oposto de escutar.
Mas, se queremos reverter os prejuízos e promover a construção de relações saudáveis e ambientes preparados para a diversidade, com segurança psicológica e respeito, temos que nos movimentar, criar espaços de escuta e conexão, facilitar a comunicação e valorizar a integridade dos sujeitos em relacionamentos.
Aliás, este é o meu conselho: eleja, conscientemente, como, quando e com quem quer treinar a escuta, coloque como prioridade para seu desenvolvimento e acompanhe a evolução.
É surpreendente o que se pode aprender nessas circunstâncias. Em pouco tempo você vai sentir-se mais presente nas interações, sua atenção vai aumentar e os laços vão se fortalecer por credibilidade, confiança e intimidade. Sem falar que a mentalidade se transforma pela curiosidade e interesse genuíno, permitindo que as suposições e julgamentos se enfraqueçam.
Nada disso é uma regra acabada, uma receita pronta ou uma lista de tarefas, são apenas observações de quem já acompanhou as mudanças em relacionamentos (pessoais e profissionais) que adotaram a escuta como um valor.
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Daniela Cais
Mestre em Fonoaudiologia – Designer de Conexões, Consultora de Comunicação Interpessoal, Palestrante e Mentora.