Da intenção à consciência – uma prática de conexão

Muitas vezes desejamos mudar algo em nossa vida, nos transformarmos, pois almejamos uma condição que acreditamos ser melhor do que a atual em que vivemos. Acontece que nem sempre nos colocamos no fluxo dessa transformação efetivamente, vamos deixando para depois, pois há outras prioridades a serem tratadas no dia a dia, ou inventamos desculpas (sejam elas conscientes ou inconscientes). E se nos atrevemos a colocar uma mudança em prática, esperamos o resultado imediato dessa mudança, o que, obviamente não ocorre, e nos frustramos com o processo, pensamos que de nada valeu a tentativa, ou pior, que nós não fomos capazes de executar com a competência necessária. É nessa hora que o chicote estala e diversos pensamentos e julgamentos negativos flutuam em nossa mente num tráfego intenso, trazendo sentimentos de vergonha, culpa, desânimo, frustração, raiva e por aí vai. A jornada de autoconhecimento costuma ser uma vítima desse processo nada virtuoso.

Foto: Max Saeling / Unsplash

Foto: Max Saeling / Unsplash

O convite hoje é para desacelerar, confiar no processo e seguir o fluxo de transformação, até que naturalmente esse novo aprendizado seja internalizado. Nesse sentido, nos motivam as palavras de Samuel Johnson:

As correntes do hábito são fracas demais para serem percebidas até estarem fortes demais para serem quebradas.
— Samuel Johnson

E tudo bem se um dia ou outro as coisas não saírem exatamente como planejado, se você não conseguir executar a nova prática como gostaria, você sempre pode retomar no dia seguinte. Além disso, tropeços, desvios, atropelos e momentos de parada para descanso são naturais nesse processo. Lembre-se que você está no ciclo de aprendizagem, acolha a frustração e tenha compaixão consigo. Não estamos buscando a perfeição, estamos buscando a constância e o aprendizado.

Como já falamos em artigos anteriores, a comunicação não violenta (CNV) possibilita que você mergulhe nessa jornada de autoconhecimento, bem como que, a partir disso, consiga ver novas maneiras de se relacionar consigo e com os outros, influenciando, portanto, as relações a nível intra e interpessoal. Ao mesmo tempo, também não é uma mudança que ocorrerá de forma imediata, sendo importante ter calma nesse processo, seguir com as práticas constantes e vivenciar dia a dia os estágios de amadurecimento. Eu acredito, na verdade, que o autoconhecimento nunca terá fim em nossas vidas, é uma prática que nos acompanhará sempre, tendo em vista que somos seres dinâmicos e mutáveis a partir de cada aprendizado e experiência que vivenciamos.

Trago aqui uma proposta de prática para apoiá-la nessa jornada de autoconhecimento a partir do olhar da CNV, e de uma inspiração das aulas de yoga que eu praticava com minha professora.

A ideia central dessa prática é que você faça observações diárias sobre o seu estado interno e perceba seus sentimentos e as necessidades que foram ou não atendidas em determinadas situações ao longo de cada dia, criando uma conexão consigo mesma.

Então, vamos à prática:

a) ao acordar pela manhã observe-se e perceba a energia que está vibrando em você e qual intenção você quer levar para esse novo dia que se inicia e todas as interações que você terá. Claro que ninguém terá a intenção de ter um dia ruim, a proposta aqui é que você perceba se está sentindo uma energia voltada, por exemplo, para a expansão ou para a introversão, para a ação ou para o acolhimento, ou seja, é a percepção mais sutil do que flui dentro de você;

b) ao final do dia, observe-se novamente, verificando se a intenção que você trouxe inicialmente fluiu durante o dia, reveja as interações que você teve (com você mesma ou com outras pessoas) e escolha uma situação em que você sentiu estar em sintonia com sua intenção original e outra em que você se sentiu desconfortável (caso tenha ocorrido);

c) aprofunde-se nessas situações, abstraia os fatos dos eventuais julgamentos e interpretações que venham à sua cabeça (em relação a você ou ao outro), perceba os sentimentos que despertam em você agora em relação ao que ocorreu e busque identificar as necessidades que foram ou não atendidas em cada ocasião;

d) finalmente, retire um momento para celebrar ou enlutar essas situações, com compaixão pelo que vivenciou e gostaria que tivesse sido diferente, lembrando que é um ciclo de aprendizagem e você está a cada dia fortalecendo esse “músculo” do autoconhecimento.

Quando menciono “necessidades” refiro-me às necessidades humanas que todos nós compartilhamos, ou seja, são as necessidades essenciais a uma vida plena. Aprofunde seu olhar, amplie seu repertório sobre si mesma.

Identificar os momentos em que as interações não fluíram em consonância com a sua intenção original, bem como as necessidades que ficaram desatendidas nessas ocasiões será desconfortável.

Permaneça no fluxo do ciclo de aprendizagem, pois esse é um desconforto produtivo, que joga a luz da consciência sobre o que geralmente ficava escondido dentro de você.

Por isso encorajo a realizar o momento do luto e a praticar a autocompaixão, pois trazem acolhimento à dor que você sentirá. Lembre-se que a CNV nos convida a um outro paradigma, o de que não há sentimentos ruins, apenas sentimentos que trazem desconforto, geralmente, porque uma necessidade importante naquele momento não foi atendida.

Você perceberá que essa prática traz clareza e desperta a consciência sobre o que é importante para que sua vida seja melhor, plena. E a consciência permite que você faça melhores escolhas para contemplar suas necessidades, aumentando as chances de efetivar a transformação que você almeja em sua vida.

Como diz minha orientadora de CNV, “seja cientista de você mesma”, observe-se com curiosidade, esteja livre para conhecer todos os detalhes de você mesma, sua luz e sua sombra. Acolha-se. Não precisa ser perfeito, só precisa ser constante e com carinho por você durante o processo.

Você pode iniciar a prática aos poucos, começando com o primeiro passo e acrescentando os demais no seu tempo, conforme se sinta mais segura e confortável no processo. Se quiser, escreva os sentimentos e necessidades num diário. Enfim, faça eventuais adequações que tenham sentido para você, o importante é começar e seguir em frente.

E se escolher realizar essa prática compartilhe sua experiência comigo :)

Material de apoio

Disponibilizamos uma lista com algumas necessidades humanas para apoiá-la nessa descoberta.

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Debora Andrade

Aprendiz da vida, em constante (des/re)construção, praticante de yoga, meditação e trekking, energizada pela natureza, interessada em temas relacionados ao autoconhecimento, gestão das emoções, relacionamentos interpessoais e integração do ser humano com a natureza. Multiplicadora da Comunicação Não Violenta e mediadora de conflitos com ênfase em mediação familiar. Dedico-me a projetos que envolvam a construção de conexões humanas por meio da CNV, da mediação de conflitos e outras práticas que estimulem a autoconexão.

Debora Andrade

Aprendiz da vida, em constante (des)construção, praticante de yoga, meditação e corrida, interessada em temas relacionados ao autoconhecimento, gestão das emoções e relacionamentos interpessoais. Acredito na vivência do ser humano em harmonia com a natureza. Estou cursando formação em Comunicação Não Violenta. Já atuei como advogada especialista em contratos no mercado corporativo por mais de 10 anos. Atualmente me dedico a projetos que envolvam a prática e disseminação da comunicação não violenta em prol de um mundo de paz.


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