O desafio da saúde da mente na era dos aplicativos

Como anda a saúde mental nos tempos atuais? Segundo dados da OMS¹ são registrados 322 milhões de casos de depressão, em conjunto com 2,5 bilhões de casos de ansiedade no mundo, ou seja, não está nada bem. E esses são dados extremamente alarmantes. Mas, quais seriam as causas dessa epidemia contemporânea? A meu ver existem diversas causas que atingem e afetam à população atual e levam a esse número problemático, porém quero propor aqui um debate a partir de questões que estão ligadas a um fenômeno da sociedade atual, que é a ampliação dos aplicativos de relacionamento e a transformação que trouxeram nas relações sociais. 

Foto: Stephen Petrey / Unsplash

Foto: Stephen Petrey / Unsplash


Sem deixar de pensar nos fatores neuroquímicos causadores da ansiedade e depressão, é importante dizer que a forma como a sociedade se organiza também é um fator importante na geração de doenças e uma das causas no aumento desses números. Só para ter uma noção, atualmente o Brasil tem uma média de 230 milhões de aparelhos celulares¹, sendo que a população brasileira está numa média de 204 milhões, ou seja, existem mais aparelhos celulares do que pessoas no Brasil. Não quero apontar o uso de celular como a causa dos males, estou apontando as transformações nas relações sociais causadas pelos aplicativos como um dos fatores. E por quê? 

Posso listar algumas das alterações causadas nas relações como as seguintes: o rápido acesso a toda e qualquer informação, o aumento na quantidade de informações disponíveis, o estar “sempre ligado” nas redes e o distanciamento das relações fora dos aplicativos. A princípio esses pontos não aparentam apresentarem algum tipo de problema, porém quero apontar o fato de algumas dessas mudanças interferirem na forma como interagimos com o mundo. Por exemplo, o aumento na quantidade de informações e o acesso rápido e ininterrupto nos traz uma sensação de facilidade e praticidade, porém isso nos gera uma ansiedade quando precisamos esperar. É fácil, está pronto, e é agora, só não quando precisamos esperar, pois parece aquela sensação de demorar “uma eternidade”.

Outro fenômeno é que sempre temos algo “novo” e estamos em busca do novo, seja uma informação, uma série, um filme ou até mesmo uma pessoa. E isso se liga a ideia de “zapear”². Os aplicativos carregam essa ação a tomando como base de funcionamento. Zapeamos as informações, zapeamos as fotos, os vídeos e, inclusive, as pessoas. O fenômeno de zapear carrega em si mesmo a ideia de que algo não nos agrada e precisa ser descartado, passado para frente. Passa-se tudo, rapidamente, para frente sem um aprofundamento, uma calma e tudo se torna descartável. Nisso, nossos pensamentos e vontades se aceleram.

O cenário é que nos individualizamos cada vez mais, passando informações e pessoas em nossos aplicativos de nosso mundinho particular.

Mas, sabemos que a vida não é assim, somos seres sociáveis e precisamos de contato humano, porém essas transformações alteram nossa percepção sobre o tempo e a vida. Estamos mais acelerados e as relações mais descartáveis.

De fato são questões que teremos de lidar e já estamos lidando, pois têm se tornado um padrão. Podemos até ver movimentos que nadam contra essa corrente, mas, no geral, o que percebemos é um aprofundamento, com uma tendência maior nas grandes cidades. Se não nos atentarmos a esses fatos, estamos nadando cada vez mais num mar onde cada um está fechado em sua bolha, “curtindo” e descartando tudo o que lhe chega na tela do celular.

¹ Organização Mundial da Saúde.

² Fonte: http://www.teleco.com.br/ncel.asp

³ Zapear: Ato de mudar constantemente os canais da televisão.

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Leonardo Menezes

Cientista Social, e Mestre em Ciência Política, ambos pela UFSCar. Além disso é professor/educador, e já ministrou aulas e oficinas de Agroecologia, Geografia e Sociologia, sempre privilegiando por metodologias participativas.

 
Leonardo Menezes

Cientista Social, e Mestre em Ciência Política, ambos pela Universidade Federal de São Carlos. Desenvolveu pesquisa na área de Agroecologia, tendo como foco a Sociologia da Ciência, e o Pensamento Complexo Ambiental. Foi extensionista dos núcleos NuMI-EcoSol e NuPER, onde desenvolveu atividades de formação, pesquisa e extensão na área de Agroecologia e Economia Solidária. Além disso é professor/educador, e já ministrou aulas e oficinas de Agroecologia, Geografia e Sociologia, sempre privilegiando por metodologias participativas. Atualmente é professor de História no cursinho popular Educar-se, na região de Itaquera, São Paulo/SP.

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