O segredo que o corpo abriga
Era uma mulher que morava sozinha, intensa de tudo na vida, com suas dores e suas delícias. Os tempos de isolamento por conta de um tal vírus não a deixavam tranquila. Acordava já com fantasmas assombrando sua rotina. Calma? Não havia. Não havia também como encontrá-la. Quanto mais a buscava, mais isolada ficava. Não era legal, não era bom, não.
Quando a mulher era criança, como se mexia! Já adolescente, pode-se dizer que ainda se movia, mas depois de adulta, tinha esquecido o que o seu corpo fazia. Até que um dia, uma amiga muito sensível a convidou para dançar. Ambas perderam o fôlego, porque já fazia tanto tempo. Em meio ao caos, a coreografia tinha que ser vista através de uma telinha e a amizade aparecia no som da voz, na cumplicidade que o agora permitia.
Juntas, sozinhas, entre amigas, encontraram no movimento do corpo um sentido. Um brilho diferente voltou, uma vontade de viver, uma alegria.
É sim este o segredo que o corpo abriga. Ele é o nosso contato maior com essa coisa louca que é existir. O corpo é natureza, como uma árvore, como um cristal - abriga a sabedoria do universo. É possível compreender muito por meio dele e encontrar um pouco de calma.
Movimentar o corpo é também expressar vida; exercitar a coragem de estar aqui; transformar um querer desistir em querer existir. Beleza e silêncio, enfim.
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Paula Neves
Uma cidadã do mundo, amante das artes e eterna buscadora da verdade. Bailarina, desde criança encontrou na dança a espinha dorsal de como se expressa no mundo. A partir daí, em seu caminho já foi atriz, publicou um livro infantil, trabalhou com relações comunitárias em grandes corporações e com inovação social em uma ong de design.